quinta-feira, 8 de fevereiro de 2018

Romance Policial – Os Adictos


Antes da Internet – que só chegou ao povo em 95 – os adictos do vício elegante de ler Romances Policiais tinham nas cabeceiras das camas uma pilha de livros. Imprescindíveis para atravessar noites de insônia e madrugadas brancas. Nunca diminuíam, apenas variava o tamanho e os títulos empilhados.

Nestas reservas estratégicas (mantenho a minha ativa até hoje) nunca faltavam os clássicos: Rex Stout, Georges Simenon, P.D.James, Mickey Spillane, Ngaio Marsh, Dorothy L. Sayers, alguns em edições difíceis de ser encontradas. Autores mais novos, de coloração vária, recém-lançados ou descobertos, também frequentavam o acervo: Patricia Cornwell e a Médica-Legista Dr. Kay Scarpetta, Harry Kemelman e o Rabino David Small, Donna Leon e o Comissário Veneziano Guido Brunetti, John Dunning e policial bibliófilo Cliff Janeway.

Era sempre eletrizante descobrir. na legião de novos escritores, os mais exóticos, de vários sabores e outras geografias: Michel Chabon e o mundo judeu, Andrea Camilleri e o Comissário Salvo Montalbano da Sicília, Manuel Vásques Montalbán e o Detetive (ex CIA?) Pepe Carvalho de Barcelona. Além de Luiz Alfredo Garcia-Rosa e o Inspetor Espinosa, genuinamente cariocas. Conan Doyle e Agatha Christie só entravam no monte para eventuais releituras.

Paulo Francis, o polêmico jornalista, que também era dependente do vício elegante e devia ter seu próprio mocó, escreveu que sempre era fácil reconhecer seus iguais pelo mundo afora, quando parava defronte as estantes de Policiais nos aeroportos e livrarias. Intuía que os companheiros – além de competidores por um eventual último volume – eram uma classe especial de pessoas, não importava a origem. Sabia que depois de um whisky o papo tinha tudo para rolar bem.

Os fãs de Romances Policiais devem ter uma conformação mental singular, apreciam contraposições e cabos de forças: exceções e regras, mundos diferentes e cenários conhecidos, transgressões e ordem, crime e castigo. Porque, mais  que tudo, desejam compreender os mecanismos que operam tudo isso.

Os mestres do gênero precisam saber um pouco de magia, podem adotam ou desrespeitar qualquer regra, desde que consigam preservar o mais importante: manter o mistério.

A ‘cor local’. Detalhes, peculiaridades, pequenos segredos, restaurantes, locais típicos, bares, lojas, costumes e gastronomia da região em que acontecem as histórias.

As 'tramas'. Patrícia Highsmith, através de Ripley, inovou na narrativa. Suas histórias são contadas pelo simpático meliante confesso que nos induz a torcer para que seus truques e tentativas de enganar as autoridades e inimigos deem certo. Interessante abordagem, pena que escreveu apenas cinco novelas.

Os 'personagens excêntricos'. Lembram de Hercule Poirot? Nero Wolfe, o rotundo detetive de Rex Stout é o mais estrambótico. Pesa 150 quilos, preguiçoso, prepotente e presunçoso. Orquidófilo fanático, leitor voraz, hedonista gastronômico e glutão. Claustrófobo, jamais saia de casa, seu auxiliar, Archie Goodwin, precisa convencer todos os envolvidos no caso a visita-lo. Gostaria de ver uma boa série da Netflix com ele.

A revista Playboy (ou outra, minha memória ás vezes me engana) perguntou a varias pessoas: 'se não fossem elas, quem gostariam de ser'. Paulo Francis respondeu Nero Wolfe.

Então seriam três – ou uma multidão – porque também queria.

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