Jorge Luis Borges, num pequeno artigo, ‘Sobre los Clásicos’,
o último do livro ‘Otras Inquisiciones’, afirma que cada país ou cultura elege
uma obra de referência para representar aquela nação ou povo. Então
passa a lê-la como se fosse uma criação supranatural, uma revelação.
Acreditando que cada frase, cada palavra tem um significado especial, capaz de
dizer muito mais do que seu contexto ou seu registro no dicionário.
Também sugere que um livro se torna um clássico não pelas suas qualidades literárias intrínsecas, mas pela reverência com que é lido e cultuado por um determinado povo.
Também sugere que um livro se torna um clássico não pelas suas qualidades literárias intrínsecas, mas pela reverência com que é lido e cultuado por um determinado povo.
Numa série de conversas radiofônicas
em 1984 (Borges em Diálogos / Rocco) pondera que o livro escolhido acaba enformando o espírito da nação.
Divaga que o clássico adotado pelos argentinos para inspirá-los foi ‘Martin
Fierro’, de Hernández, um poema gauchesco que conta a historia de “um desertor,
um malvado, um assassino sentimental”. Para o país, talvez, uma melhor opção
teria sido adotar ‘Facundo: Civilización i Barbárie’, de Sarmiento, que valoriza a ideal
de civilidade e democracia.
É produtivo pensar pela chave proposta por Borges, correlacionando o clássico nacional e o espírito do país.
Tomando Portugal, o grande clássico lusitano sempre foi 'Os Lusíadas’, a saga de um povo orgulhoso, exíguo, navegante e conquistador. Porém,
parece que está sendo substituído pelos versos de Fernando Pessoa. Um poeta
plural, de vozes diversas e variados pontos de vista. Um autor cosmopolita, com
uma obra inacabada, não publicada em vida, que ainda hoje esta sendo descoberta e consolidada.
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Quem sabe Portugal esteja migrando para Fernando Pessoa
porque se vê como uma nação em reconstrução.
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O clássico que o Brasil consagrou como guia foi Machado de
Assis, mais precisamente seus cinco grandes romances, os últimos que escreveu.
E entre eles, especialmente, ’Dom Casmurro’.
Estranha seleção, porque o autor é um mulato que emula e defende
os valores da alta classe média. Estoico, resignado, fatalista, irônico e
desapaixonado. Que rejeita terminantemente a paternidade, para evitar deixar as mazelas humanas como herança para seus descendentes. Seu principal livro fala de
uma relação naufragada por causa de um mistério ocluso, nebuloso e indecidido.
No livro ‘Ao Vencedor as Batatas’ de Roberto Schartz, um
especialista em Machado de Assis, um dos principais capítulos chama-se: ‘Ideias
Fora de Lugar’. Um título inquietante, cheio de augúrios e premonições.
É interessante pensar aonde cada um desses livros levaria o Brasil.
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