Rio de Janeiro, 10 de
Dezembro 1935
Querido Mário de
Andrade:
No começo de nossa
amizade, em 1921, firmamos um ‘pacto pagão’. Combinamos que nossas conversas
seriam sempre face a face, francas e livres. Sem segredos nem discussões religiosas, políticas ou morais. Penso que fui eu a propor o acordo porque tenho
a cabeça panda de incoerências. Sobre Religião coleciono certezas
absolutas, sobre Política (como monarquista ou sebastianista sem rei) não sei
me explicar direito e ainda estou inventando uma moral para caber dentro dela.
Concordamos, acima de tudo, em não trocar correspondências. As cartas são como fotografias, tentam deter o rio de Heráclito. E as relações humanas são dinâmicas, repletas de nuances,
até as lembranças são falazes e enganosas. Sempre é melhor conversar, viver o momento e
falar da cor real de cada coisa. Sei que és um missivista compulsivo e que
nossos encontros são esparsos, mas calculo que a decisão foi acertada.
Estou quebrando a
regra acordada porque fui te procurar em S. Paulo e não encontrei. Sabes
que, no Brasil, és meu mais próximo e confiável amigo. Era imperativo te falar
sobre as estranhezas que aconteceram comigo duas semanas atrás.