A forma mais divertida
de praticar Audiofilia é visitar as salas de som dos amigos, porque cada hobista
é único, diferente e peculiar, como os desenhos da íris, os mapas genômicos e
as impressões digitais. Também, apesar das especificações técnicas, os
equipamentos, verdadeiramente, só revelam seus poderes e fraquezas quando
acoplados num setup, afinal o que toca é o sistema inteiro, componentes mais
solução acústica.
Nesse sentido,
visitar o paraíso audiófilo do Arnaldo Pappalardo – um conceituado e
multipremiado fotógrafo e arquiteto (vejam no Google) – é um privilégio raro, ganhamos tempo e ouvimos três setups
sem levantar da cadeira. Porque, se todo adicto é singular, o Arnaldo vai além,
faz uma curva em torno do ponto, mantem uma trinca de sistemas operando
paralelamente.
No dia da visita,
uma quarta feira, 11/12/2013, numa agradável residência perto da Praça
Panamericana – casa de arquiteto – estavam ativos três sistemas distintos, que
cobriam uma vasta gama de preferências possíveis. Para evitar classificações na
apresentação dos setups, em vez de números, melhor usar cores (porém, aviso, sou
palmeirense).
Setup Amarelo
Fontes: CDplayers,
Vinil e Digitais
DAC: DAC2 –
Luis Flugghe
Pré: Plinius
16
Power:
Atma Sphere OTL – modelo MA-2
Caixa:
Magnepan MG 1.6 QR
Cabos:
-
USB Furutech
-
V-Link da Musical Fidelity (Asynchronous USB para SPDIF – 96 kHz)
-
Mark Grant (England)
-
(DAC > Pré) Nordost Red Dawn
-
(Pré > Power) Harmonic Technology Magic
-
(Caixa) Alpha Core Goertz – prata chato ¾”
Toca-disco: Linn Sondek LP-12 – Capsula Shelter 750
Pré de Phono: ASR Mini Basis
- (Pré de Phone > Power) KSL-Vz – Audio Note (Japan)
- (Phono) Harmonic Technology Reference
Já escutei algumas caixas planares – menos do que gostaria
– sempre me encantaram e intrigaram por causa da formação do palco sonoro,
esbanjam precisão e nitidez. Tudo que tocamos naquela noite, no setup amarelo, impressionou
pela correção e detalhamento. Era possível acompanhar cada nota ou acorde
nascendo, ocupando seu lugar na música e decaindo, com exatidão e elegância.
Entretanto, como as planares encaravam e resolviam grandes
massas sonoras? Era um mistério para mim. Assim, quando o Arnaldo sugeriu que
escolhesse um disco, extrapolei. Perguntei pela Oitava de Mahler – ’Symphony of a Thousand’, porque composta
para mil participantes – nesta obra aparecem os maiores volumes sonoros
organizados que já ouvi. Apareceu um estojo de LPs ainda lacrado, uma edição referencial
da Decca, de 1971, gravava pela Chicago Symphony Orchestra e Georg Solti
regendo. Ouvimos da primeira reprodução dos discos, garantem ser a melhor..
Fiquei embasbacado com a experiência auditiva e sensorial,
parecia que estava num imenso auditório, sentado no camarote real. O acontecimento
musical se formava num palco gigante, que se desdobrava e se espraiava sem
limites, na minha imaginação e para os meus ouvidos. Me sentia como um
espectador sobrevoando a orquestra, surfando na onda sonora, as caixas haviam
sumido. Identificava cada instrumento e cada solista, desde as flautas piccolos
até os contrabaixos, sem perder qualquer detalhe ou intenção dos artistas.
É uma forma de curtir a música que pode viciar.
Setup Azul
Fontes: CDplayers,
Vinil e Digitais
Pré: Plinius
16
Power:
Musical Fidelity A3CR
Caixa:
Totem Model 1 Signature
Cabos:
-
Wireword Series 3
-
(Caixa) Furutech Reference
O que mais se destacava era a qualidade das caixas, um par
de books, perfeitas e poderosas, cobriam com competência toda a gama de sons.
Para quem prefere Jazz, vozes, Música de Câmara e conjuntos instrumentais, mas ás
vezes arrisca em óperas, sinfonias ou concertos, pode ser a solução ideal para
ambientes até de tamanho médio. Resolviam bem uma dualidade típica dos
concertos: as peculiaridades do instrumento solista - em geral mais pessoal e
delicado; e a inundação torrencial da orquestra acompanhante.
Setup Verde
Fontes:
CDplayers, Vinil e Digitais
Integrado: Audio
Note Kit 1
Caixa:
Horn Fostex DIY – falantes FE-206 e supertweeter T-90A
Cabos:
-
(fonte > integrado) Goertz prata chato
-
(Caixa) Shunyata Constellation Lyra
Com
umas centenas de mídias contendo vozes femininas, pequenos conjuntos, solistas
barrocos e similares, não me importaria de ficar ouvindo este setup até as
montanhas se desgastarem e virarem areia. A suavidade, a veracidade, a transparência são
inacreditáveis. O som é contido, correto e cuidadosamente desenhado. O Audio
Note tem as mesmas virtudes dos cantores intimistas e dos virtuoses exigentes,
sempre buscam o necessário, o suficiente, o adequado; fogem do excesso, da
sobrecarga, do profuso, do borrado.
Envolvido na mágica do Setup Verde, passa pela cabeça a ideia de abdicar da música de maior massa sonora. O fascínio é quase irresistível, conheço audíofilos que tomaram este caminho.
Envolvido na mágica do Setup Verde, passa pela cabeça a ideia de abdicar da música de maior massa sonora. O fascínio é quase irresistível, conheço audíofilos que tomaram este caminho.
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Então
compreendi a conveniência da solução do Arnaldo, ficar com os três é a única
resposta que não implica nenhuma frustração. Perguntei como era o revezamento
entre as múltiplas possibilidades da sala? Com que frequência alternava entre
os sistemas? Respondeu que, normalmente, usava o mesmo setup o mês inteiro,
mais até, só mudava quando a saudade de outro tipo de musica, ou de outras
sonoridades das suas mídias, compensava o esforço da migração e da readaptação.
De
alguma forma, este é sonho de todo audiófilo, porque é fácil escolher um setup;
difícil é abrir não de todos os outros.
Desculpas e agradecimentos:
– Arnaldo Pappalardo, obrigado pelo convite e desculpa pelas imagens, de qualidade quase ofensivas para um fotógrafo, foram colhidas por iPhone e por um operador medíocre.
– Wram Roberto de Camargo Accorci, obrigado pelas longas e agradáveis conversas e pela consultoria técnica.
Se cada sistema do Arnaldo estivesse num ambiente diferente, aí sim se justificaria tê-los. Pela descrição do Douglas e do próprio Arnaldo, cada um dos 3 sistemas toca bem determinado tipo de música. Sendo assim, conclui-se que nenhum dos 3 sistemas é um bom sistema, pois se o fosse, tocaria bem qualquer tipo de música. A própria descrição dos 3 sistemas já demonstra que a sonoridade deles são muito diferentes entre sí, independente das fontes ou eletrônica, pois as caixas planar x books x full-range não tem nada a ver uma com as outra.
ResponderExcluirObrigado pela atenção e comentário.
ResponderExcluirArnaldo esta a 3 passos da maioria de todos nós. Manter um sistema já é dificil, imagina 3. A experiência deve ser incrível! Parabens aos mestres.
ResponderExcluirRafael Bardal, me deu inveja, mas faltou coragem. Com uma cdteca de 3000 cds, seria insano ouvir 3 vezes cada.
ResponderExcluir"Caro Douglas,
ResponderExcluirTudo bem?
Queria te agradecer o seu texto sobre a visita à minha casa.
Fiquei muito lisonjeado com a sua apreciação dos "meus sons" e mesmo do ambiente da minha casa, observações muito sensíveis e atentas.
Também queria te dizer, que você sabe, pela sua formação como filósofo, que esta nossa loucura com som tem muito de Schopenhauer.
Sempre queremos o que não temos...se o "som" não esta bom, queremos modifica-lo.
Se esta "tudo certo", isso também traz uma angústia, porque isso cessa um movimento, um deslocamento, uma possibilidade de invenção.
Os audióphilos se não perceberem isso, podem estar fadados à uma infelicidade constante.
Essa minha estratégia dos 3 sistemas foi um truque , que me faz "driblar" essa eterna angústia.
Um grande abraço,
Arnaldo."
Arnaldo,
ExcluirOs agradecimentos são todos meus e triplicados. Foi um prazer imenso visitar sua sala e aprender um outro modo tríplice de praticar Audiofilia.
Sobre a inquietação filosófica, transliterando Descartes: “No ‘querer’ nos igualamos à Deus, mas no ‘poder’ somos, humildemente, apenas homens.”
Estou copiando este teu e-mail e minha resposta como comentários da publicação no Blob Paulistando, para complementar a matéria.
Obrigado, de novo,
Douglas.