quinta-feira, 2 de outubro de 2014

7 CORES INVENTADAS

7 Cores Inventadas
Ciclo de sete poemas, de formato livre, revisitando e
homenageando sete pintores, três holandeses e quatro
italianos, que utilizam algumas cores de maneira peculiar, 
inusitada ou estranha, como se as tivessem apartado
do espectro solar e tomado posse delas.

Nas pinturas de Johannes Vermeer (1632/1675), as mulheres liam cartas, muitas. E se uma delas fosse do marido em Recife – na Invasão Holandesa, da primeira sinagoga fundada nas Américas – morto de saudades, tentando traduzir este sentimento para a amada.

Os mestres de Jacopo Robusti Tintoretto (1519/1594) eram Michelangelo
e Tiepolo, porém a pressa, o movimento e o desvio para o vermelho
de suas pinturas não vêm de nenhum dos dois.

Para Giambattista Tiepolo (1696/1770) mundo e céu,
deuses, homens e seres mitológicos eram azuis
e conviviam diariamente.


Rembrandt van Rijn (1606/1669) era um dos grandes mestres, pintou muitos autorretratos, os mais fiéis possíveis, lhe aprazia mostrar para o Tempo
– esse vampiro íntimo e insaciável – sua atroz voracidade. Apreciava também
captar com precisão a luz, que sempre existe, mesmo que seja de viés.

Ticiano Vecellio (1473(?)/1576) nas suas incontáveis e policromadas
veladuras de cores inimagináveis, inventou tons de rosados que ninguém
sabia que existiam. Habitadas por mulheres lindas, sublimes, idealizadas e inalcançáveis. Ilustrações do melhor que a espécie humana pode produzir

Vincent Van Gogh (1853/1890) compartilha com Poe e Lovecraft a mesma esquisitice e inquietude. Tentam nos convencer que vivemos numa realidade paralela e descolada do real. Tudo que vemos, tocamos ou percebemos é falso, frágil e quebradiço, se desmanchando no ar.

Vittore Carpaccio (1465/1526), transubstanciado, está presente nas mais sofisticadas mesas do mundo. Quando encontrado nos museus e galerias de arte, sempre dá um nó
– e ás vezes fome – no entendimento do apreciador.















12 comentários:

  1. A arte companheira da minha vida ,pintura ,poesia, doce encanto ,que magia...

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  2. Obrigado pela visita Márcia Corina Mendes Lins. Na minha vida também a Arte é uma necessidade quase orgânica. Se pudesse escreve uma poesia sobre cada quadro que gosto.
    Douglas Bock

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  3. Suas poesias são um transdialogismo atemporal (se posso nomear assim). É o fio de Borges, Eliot e demais que se embrenharam nessa mata além do agora, refloresce no agora sem estar precisamente no agora. Você puxa esse fio para diante com uma marca própria. Tecelagem ao infinito, é o que consigo ver, com múltiplas mãos a fraudar o tempo. Fico imaginando o que Vincent Van Gogh, Borges e os demais teriam a acrescentar nessa teia se estivessem ainda entre nós. Você está em comunhão com eles, e tudo isso escapa ao tempo. Necessário seria toda uma história da cultura para abarcar o todo que se pronuncia em suas imagens poéticas, coisa que um breve comentário não pode pretender. Contudo, sua poesia nesse todo está imersa. A fruição é direta, e permanece, como tudo que está fora do tempo e, paradoxalmente, nele.

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  4. Obrigado. Vilma Silva, por ajudar a enriquecer o entendimento do conjunto de poemas.

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  5. "Sete cores inventadas". Senti o cheiro das tintas, Douglas! Sua poesia hoje coloriu meu céu cinzento. Siga assim, pintando o sete. Grande abraço!
    Paulo Miranda Barreto

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  6. Obrigado pela visita e pelo comentário, paulomirandabarreto.
    Gostei do achado, 'pintado o sete', para descrever o conjunto de poemas '7 Séries de 7'.

    Quando tomaremos o café?
    Douglas Bock

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  7. A tessitura poética em AMARELO VAN GOGH: nesse poema as imagens intercruzadas estão muito bem alinhadas à intrusão do bolor. Atirar em si mesmo para matar os corvos de Poe é outro intercruzamento fantástico, nos dois sentidos deste termo. O intercruzamento está completo na imagem final. Estupenda essa imagem. Causa grande impacto pela dramaticidade conseguida nesse cruzamento de figuras. O grupo de Fernando Pessoa criou o Interseccionismo. Penso que desse poema poderia também dizer-se que é inteserccionista, em seu feitio próprio de imagens cruzadas para construir e alinhavar o desfecho final. Esse poema acende o olhar para o que ultrapassa as personagens envolvidas nele. É as imagens que importam. Elas é que falam tudo. Isso é o que se pode chamar de uma bela tessitura.

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  8. Obrigado pelos comentários Vilma Silva.
    Temerariamente tenho fortes razões para pensar que nós, das culturas periféricas (R.Schwarz), os da língua-pátria de FP, os europeus exilados da América do Sul estamos condenados inexoravelmente ao interseccionismo. Em nós o assombro e o fantástico é imanente. Não acha que Borges e Cortázar também o são?

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  9. Essa questão que você propõe é muito ampla. Por ora não sei sintetizar uma resposta justa, e talvez não haja resposta, ou inumeráveis respostas, e todas podem ser válidas... Tudo acaba mesmo temerário, mas, se não nos damos a pensar junto com o outro, não iterconectamos nossos pensamentos, e isso é muito importante, não acha? A velocidade hoje quase que torna isso uma heresia, porque ninguém mais se detém em nada. Tenho a impressão de que no geral as coisas passam pelas pessoas, elas jamais passam pelas coisas... e entrar nelas para saber o que são é coisa que passa ao largo. Isso a internet deu conta de mostrar muito bem. Poucos param para olhar de verdade o que estão lendo, as coisas voam entre as pessoas e elas não veem nada. Não há tempo para ver nada com olhar detido... Essa é a minha impressão... (E o que será isso? Pergunto, porque aí tem algo muito importante também para entender...)
    Diante dessa condição é preciso ser herético para falar... Então, num recorte, o conceito de interseccionismo se ajusta muito bem à nossa psique. É um belo conceito e nele a definição de um fenômeno está presente, mesmo na forma como Fernando Pessoa o delineou como processo de construção poética. E você tem razão. Mas, noutra via, não passa de um conceito e esse mesmo fenômeno pode ser representado em muitas outras formas conceituais, igualmente definidoras do mesmo fenômeno, igualmente válidas.
    E, noutro recorte, somos seres verbais, possuidores dessa via para nomear o mundo, e o nomeamos e o renomeamos em abundância. E, se precisamos das palavras para configurar nossos pensamentos e a nossa percepção dos fenômenos, o conceito e a definição que ele oferece é uma exigência do próprio ato de perceber e pensar. Logo, as definições são pertinentes aos seres verbais que somos. São muito boas para nossa necessidade de nomear, ver e vislumbrar o que sentimos e vemos; são muito boas para que possamos palavrear sobre o mundo, o humano, a poesia... palavrear sobre a palavra e o poema mesmo e dar figura àquilo que não se deixa prender em figura nenhuma, já que tudo está ali na figura mesma. Logo, essencialmente, a definição acaba figura da figura e isso não tem fim...
    Mas importa ressaltar nessa fugacidade do conceito outra conexão que não pode ser deixada de lado: a palavra é também o pensamento que se manifesta para se dizer a si mesmo. Em síntese, pensamento e palavra são intercomunicantes nesse sentido... E nisso há muito interseccionismo e infinitas interconexões, intercruzamentos etc... Todas as coisas se tocam e se interconectam, são elos infinitos e a coisa não tem fim... Me parece que o festival mirabolante do antiquíssimo Dioniso mostra-nos a maior conjunção carnal entre os fenômenos já representada...
    E, noutra esfera ainda, a física quântica já nos apresentou o campo infinito das possibilidades, todas podem tornar-se encarnadas no mundo mediante escolha da consciência. Consciente, ou inconscientemente, somos nós que determinamos o que vai existir... Não conheço suficientemente Cortázar para dizer dele... Mas Borges já sugere isso em seus contos... Olha o que essa inferência da física quântica representa para essa visão de mundo hoje delimitada pelo mecanicismo e materialismo generalizado. Muitos já estão conectados a essa nova forma de ver... A mente humana vai mudar de rumo e foco... Mas o mais importante: que mundo estamos criando agora e que mundo passaremos a criar? Desculpe-me por esse texto longo e o por me estender além de sua questão essencial. E muito grata por essa oportunidade de diálogo... Fica com um abraço!

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  10. Acho que o seu texto tem muitas ideias interessantes e desafiantes, com origens e vetores diferentes, mas todas se cruzam, se interseccionam num momento fértil para interrogações.
    Não sei se houve um tempo tão desafiante e cifrado como o que estamos vivendo, provocado pela entronização da Internet na vida das pessoas. Tudo o que leio sobre a Internet dá a impressão de que acerta muito, porém não diz tudo.
    Se fizermos uma leitura comparativa do mesmo problema, hoje e 30 anos atrás, ficamos estarrecidos com as disparidades e sentido das mudanças. Por exemplo, escrevi um artigo chamado ‘Disque M, Um Crime Perfeito, e a Inflação (http://www.paulistando.com.br/2013/09/disque-m-um-crime-perfeito-e-inflacao.html). Percebi que os valores e a estética de Hitchcoke, apesar de clássicos e cultuados, não tem o menor sentido nos dias atuais. Vou citar um trecho que expressa esse meu desassossego: ”O cinema sofreu uma metamorfose e caminha para um gigantismo de elefantíase, de quebra-cabeça, de micro detalhes. Quem sabe irreversível. A atenção se deslocou dos 'sentimentos' para os 'acontecimentos'. Antes, as ênfases eram nas 'emoções', agora estão nas 'ações'. Saímos das salas escuras pilhados, estupidificados, com excesso de informações e alternativas. Contudo sem simpatias nem antipatias pelos personagens. Vilões e heróis são cambiantes (cadê a catarse?). Não sobra nada para refletir em casa, porque tudo já foi demasiadamente estilhaçado e confundido. Não importa mais 'pensar', é preciso apenas 'reagir'.”
    Sobre o interccionismo intrínseco sul americano. Dedicamos 90% do nosso tempo de estudo às culturas europeias e norteamericanas, às formulação desses estrangeiros dos seus problemas e ansiedades. Quando intervimos é sempre de fora, como a interseção intempestiva de um ‘outro’. Entretanto, se abstrair desse problema estrangeiro é como abandonar as mais importantes questões da humanidade. Vejo este dilema inclusive nas discussões atuais da grade curricular. Africa, brasilidade ou Europa?
    Desculpe Vilma, devo ter sido longo, prolixo, obscuro e confuso.

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  11. Isso que você diz do cinema é interessante e talvez reflita esse momento fatigante que vivemos. Como você, também me sinto desassossegada. Essa correria dos tempos atuais não nos deixa tempo para refletir. Mesmo que não queiramos está aí a tomar todo o espaço da nossa vida e parece que não temos escolha. Isso me impressiona. Parece-me que nada sobrou do que tínhamos. O mundo parece que está em reformatação. Na verdade acho que estamos passando por uma reformatação de nós mesmos. Vou ler o artigo que você mencionou.

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  12. Tudo isso, Vilma, assisti o ultimo filme de Woody Allen, "Homem Irracional", onde se fala muito da Filosofia francesa e alemã pós-guerra - a que estudei na faculdade - contudo, a mensagem que fica, no fim da fita, é que não tem mais o menor sentido.

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